Tabu
O multi-premiado filme de Miguel Gomes, Tabu (2012) é poesia na imagem e na palavra desde o primeiro segundo. Dramático, é um filme que na sua negritude se entranha no âmago do espectador, mesmo no mais desatento.
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| Pilar |
Tabu está dividido em duas partes: Paraíso Perdido e Paraíso, uma dolorosa opção narrativa entre passado/presente centrada na vida da protagonista Aurora (Laura Soveral) e dois diferentes cenários: Lisboa (realista) e África (romantizada). Aurora, já idosa, vive em Lisboa com a sua empregada negra, Santa (Isabel Cardoso) e passa os dias a perder dinheiro no Casino e deprimida. Solitária, tem uma filha emigrada no Canadá. No mesmo prédio, vive Pilar (Teresa Madruga), uma activista de meia-idade solitária que adora cinema, generosa e que sai às vezes com um amigo que é um pintor frustrado. É este o Paraíso Perdido. Eis que Aurora adoece e pede a Santa e Pilar para procurarem um misterioso homem chamado Ventura (Henrique Espírito Santo). Ele narra-nos a verdadeira história de Tabu, uma trágica história de amor e uma história maior, um reflexo da história colonial, em modo sinédoque. Existe afinal, Paraíso, Purgatório e Inferno, passados em África, no Monte Tabu, a juventude de Aurora (Ana Moreira) e o seu envolvimento com Ventura (Carloto Cotta), formando um fatídico triângulo amoroso com o seu marido.
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| Aurora e Ventura |
O uso do preto e branco de forma incontestavelmente elegante e clássica apela a um permanente sentimento de nostalgia, a um tempo que não mais volta, a uma memória perdida para sempre. De assinalar o facto de na segunda parte do filme existir silêncio nos diálogos, como se o espectador não pudesse ouvir o que as personagens dizem porque é omnisciente, já que lhes lê os pensamentos, absorvidos da primeira parte perdida.
Tabu retrata ainda a perda e a solidão do mundo moderno de forma cinzenta e melancólica, o envelhecimento como claustrofobia, as limitações de liberdade e até mesmo o abandono.
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| Aurora |
A banda sonora é magistral, particularmente o tema de piano.
O elenco é de excelência, destacando-se a prestação, a meu ver, de Teresa Madruga e não é por acaso. Esta é uma personagem que faz a ligação das duas partes, sobretudo através das suas idas ao cinema. Ela é, tal como nós, espectadora. Emociona-se e na sua ingenuidade, inocência vai ouvindo o som de outro tempo, mas no presente: "Be my baby", The Ronettes, fazendo a ponte entre Lisboa e o Monte Tabu. Entre a realidade e o sonho.
Miguel Gomes é exemplar na realização, a fotografia é belíssima e o argumento de Miguel Gomes e Mariana Ricardo é poético e apesar da divisão do filme, não é fragmentário. Um belíssimo filme.
Fica-nos a certeza que nadará para sempre no lago do Monte Tabu o crocodilo Dundee...e resta-nos no final um soco no estômago. Silencioso.
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| O céu no Monte Tabu |




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